04/11/2022 - Saúde intestinal dita eficiência produtiva dos frangos de corte
Responsável pelo processo digestório, o trato gastrointestinal é onde os alimentos consumidos sofrem transformações físicas, químicas e enzimáticas para que os nutrientes possam ser liberados e absorvidos de forma eficaz pelo organismo. Mas para que isso aconteça de forma adequada os frangos precisam apresentar um trato digestório saudável.
Sobre a saúde intestinal dos frangos de corte como ferramenta de melhoria dos resultados produtivos e econômicos, a médica-veterinária, professora, mestre em Nutrição Animal e doutora em Zootecnia, Jovanir Inês Müller Fernandes, palestrou no 2º Dia do Avicultor, evento promovido no dia 25 de agosto pelo Jornal O Presente Rural em formato híbrido, alcançando mais de 6,5 mil pessoas, entre participantes presenciais e aqueles que acompanharam a transmissão online e on demand.
Entre os maiores produtores mundiais e o principal exportador global de carne de frango, Jovanir reforça que o Brasil possui alguns desafios para atender a demanda mundial por alimentos, entre eles a elevação dos custos relacionados não só às matérias-primas, mas, principalmente, a baixa oferta de pintainho.
Conforme dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP), nos últimos dois anos o preço do pintainho de 1 dia aumentou mais de 80%. Em junho de 2020 custava entre R$ 1,20 e R$ 1,30, já em junho deste ano o valor chegou a ser comercializado entre R$ 2,25 e R$ 2,53. “Os problemas sanitários que afetaram as matrizes de 2021 para 2022 fizeram com que tivéssemos menos pintainhos disponíveis para o alojamento, o que está interferindo na disponibilidade dos animais agora”, pontua Jovanir, ampliando: “Muitas vezes acabamos incubando ovos que talvez não teriam a qualidade sanitária suficiente para serem incubados, mas como o custo de produzir um ovo é muito alto tudo que tem casca vai para o incubatório, o que gera outros problemas ao longo do ciclo de produção”, menciona a médica-veterinária.
Outro fator que tem impactado a produção é o custo com a ração e dos demais ingredientes que compõem a alimentação dos animais, os quais representam mais de 60% do investimento total da atividade, por isso que a conversão alimentar tem sido cada vez mais adotada a fim de melhorar o desempenho das aves e a rentabilidade das granjas. “Quando vamos falar de saúde intestinal nós temos que enxergar o intestino como transformador da ração em carne e, para isso, uma boa conversão alimentar é essencial. O intestino é o grande órgão que vai ofertar para o organismo o que ele precisa para o seu crescimento”, menciona a mestre em Nutrição Animal.
Primeira semana de vida
Entre os principais desafios da primeira semana de vida do pintinho estão o controle da temperatura corporal por meio da regulação da temperatura ambiente, acesso rápido à ração e a água após a eclosão, microbiota intestinal instável e em colonização, sistema imunológico adaptativo imaturo e baixa digestão de grandes quantidades de ração.
Os frangos de corte têm um ciclo curto de vida, em média 42 dias. Já é possível perceber um ganho expressivo de peso na primeira semana de vida do pintinho, fase essa considerada essencial porque determina a velocidade do tempo de abate. “A primeira semana de idade do pintinho representa em torno de 18% do tempo de sua vida e é nesta semana que os animais têm o maior ganho de peso proporcional, de quatro a cinco vezes o seu tamanho. É neste período também que a ave tem um crescimento muito grande do intestino, órgão responsável por transformar a ração em carne”, expõe Jovanir.
Neste processo, a microbiota intestinal exerce inúmeras funções benéficas no organismo dos frangos. Composta por bactérias que trabalham para transformar os nutrientes em carne, além de contribuir para o sistema imunológico distinguir entre substâncias boas e nocivas.
Desenvolvimento da microbiota intestinal
Com a produção em escala industrial há cerca de quatro décadas, as galinhas de postura deixaram de cuidar dos pintinhos e os ovos passaram para os incubatórios, locais em que a umidade e a temperatura são controladas e há um rígido controle de higienização para evitar qualquer tipo de contaminação, garantindo assim o fornecimento de pintainhos de qualidade ao mercado.
No entanto, esse processo fez com que os animais deixassem de desenvolver uma colonização de bactérias boas em seu intestino, ficando mais suscetíveis a doenças. “Quando este pintinho eclode e vai para a granja possui baixa carga microbiológica, se encontrar um ambiente em boas condições vai desenvolver uma microbiota intestinal mais adaptada, estável e em colonização por bactérias boas, por outro lado, se encontrar um cenário contrário poderão se estabelecer bactérias ruins em seu intestino, que podem desencadear doenças”, pontua Jovanir.
A doutora em Zootecnia frisa que a mucosa intestinal fornece uma barreira eficaz entre o conteúdo intestinal e os tecidos internos do hospedeiro. A colonização da microbiota é iniciada ao final da incubação até o terceiro dia de vida, quando passa para o processo de maturação (4º ao 14º dia) e se estabelece no organismo após o 15º dia.
O intestino representa cerca de 5% do peso corporal, entretanto, demanda alto aporte nutricional, pois utiliza entre 23 e 36% do total de energia do frango, e entre 23 e 38% dos aminoácidos absorvidos pelo organismo. “Quando existe um processo inflamatório aumenta para 30% a energia e em 33% a exigência por proteínas no organismo do frango”, elenca Jovanir.
O trato digestório tem a maior área de superfície em contato com o meio externo, servindo de barreira entre o meio luminar e os tecidos animais, ou seja, 70% das células do sistema imune estão localizadas na mucosa do intestino. “Tudo o que acontece no trato digestório tem um impacto muito grande no organismo do animal, porque todos os sistemas se comunicam com a mucosa intestinal, que é o tecido mais rico em células do sistema imune”, ressalta Jovanir.
De olho no aviário
A médica-veterinária diz que é fundamental o avicultor entrar na granja para observar os animais, a fim de perceber se há alguma anormalidade no comportamento das aves, se há muco ou fezes que podem expor um problema com disbiose ou enterite, por exemplo. “Uma inflamação traz um custo muito grande para os produtores, por isso quando observado muco ou fezes na cama do aviário é preciso investigar, porque as aves passam a não absorver mais os nutrientes como precisam e gastam muita energia para se defender; como resultado têm uma conversão ruim”, cita Jovanir.
Outro grande desafio de ser combatido nas granjas são as salmoneloses. De grande risco para a avicultura industrial e à saúde pública, a prevenção e o controle sanitário são condições fundamentais para garantir o desenvolvimento da avicultura brasileira no mercado interno e externo.
Plano de ação
Para enfrentar esses desafios, Jovanir orienta que o produtor tenha um plano de ação com metas claras sobre o que fazer em cada situação na granja, que incluam um programa de biosseguridade, intervalo sanitário, tratamento de cama, uso intensivo de desinfetantes, limpeza a seco, controle de vetores e destino adequado de resíduos. “A limpeza com água nos aviários é muito questionada, porque a água é o terceiro agente com maior potencial de propagação de doenças, sendo recomendado seu uso apenas quando as camas forem trocadas. Quanto menos água o produtor usar na limpeza é melhor. A recomendação é utilizar uma escova para fazer a limpeza a seco, a qual acaba tendo um impacto muito mais positivo sobre o controle microbiano do que usar água, porque a água significa potencialidade de crescimento de microrganismos na granja”, enfatiza.
Fonte: O Presente Rural